Nem o início da reabertura do comércio de rua, nem o veto do presidente Jair Bolsonaro a artigos do projeto de lei que tratava de dar poder aos síndicos para fechar áreas comuns durante a pandemia, fizeram os administradores de condomínios abrirem mão das medidas restritivas para proteção dos moradores
No Paseo, em Diadema, onde vivem 2,5 mil pessoas, as visitas são limitadas, obras foram suspensas e áreas comuns estão fechadas - Foto: João Marcos.
Os síndicos estão amparados, parcialmente, no artigo 1348, do Código Civil, que dá atribuição de tomar medidas para assegurar a saúde dos moradores, mas o impedimento de uso de áreas comuns deve ser objeto de votação em assembleia para maior segurança jurídica, avalia o consultor Vander Ferreira Andrade.
O comércio de rua abre em toda a região metropolitana nesta segunda-feira (15/6), o que trará, a exemplo do que já acontece na Capital, aumento de consumidores nas ruas. Boa parte do público nas ruas é morador de condomínios, o que aumenta a chance de disseminação do vírus, alertam infectologistas. Ao mesmo tempo foi publicado na sexta-feira (12) a legislação que trata dos condomínios, o projeto de lei 1179, teve vetados pelo presidente, vários artigos, como o que dava aos síndicos o poder de, sozinhos (sem assembleia), fecharem as áreas comuns, como piscinas, academias, churrasqueiras e salões de festas, durante a pandemia.
Apesar das duas novas situações nada deve mudar, ao menos por enquanto, nos condomínios. Gilberto Chuler, síndico profissional e vice-presidente da Abrascond (Associação Brasileira dos Síndicos de Condomínios), considera que a situação gerada pela pandemia é excepcional e, portanto, o síndico deve atuar para assegurar a saúde dos moradores. Comenta que a convenção diz que o síndico é responsável por cuidar da saúde do morador e se, no momento de isolamento a solução é bloquear as áreas comuns, isso tem de ser feito. “Como vou cuidar da saúde se abrir churrasqueira e salão de festas?”, indaga. “Onde sou síndico essas áreas comuns vão ficar fechadas porque assim preservo vidas”, analisa.
O professor e vice-reitor da Fundação Santo André, Vander Ferreira de Andrade, disse que o aspecto principal do projeto de lei, que era o de estabelecer as assembleias virtuais foi preservado. Para Andrade, os vetos de Bolsonaro trouxeram segurança jurídica. “Não estava claro que o síndico poderia fechar as áreas comuns somente durante a pandemia. A redação era preocupante e do jeito que estava o síndico se quisesse poderia manter as áreas fechadas mesmo após a pandemia”, explica Andrade, autor do Manual do Síndico Profissional (Editora Nelpa).
Mas quanto ao fechamento das áreas comuns durante a pandemia, Andrade é favorável. Diz que o síndico tem de preservar as pessoas e se esforçar para manter as áreas fechadas, mas isso tem de passar por uma assembleia e se não tiver oposição isso vai trazer a segurança jurídica. Um condômino que não concorde pode trazer problemas ao síndico e ao condomínio. “Se não tiver o consenso (através da assembleia) e um morador cismar pode ir na Justiça e pedir indenização por estar em dia com as cotas e ser proibido de usar as áreas comuns. Ele pode pedir indenização por dano moral”, comenta.
Condomínios reforçam higienização e acesso
Administradora de um condomínio com aproximadamente 2,5 mil pessoas em Diadema, Priscila Camargo Rosante de Andrade, diz que está proibido o acesso à piscina e sauna e também a realização de obras “Tive boa aceitação, claro que um ou outro não concorda, mas o síndico vai sempre primar pela maioria. Tínhamos cerca de 10 casos, pessoas da área da saúde, e todas respeitaram o isolamento e fizeram a quarentena”, comenta.
Priscila diz que comunicação e transparência têm resolvido pequenas situações de conflito. “Aqui temos meios de comunicação, então eu disparo e-mails com recomendações, transitar nas áreas comuns é só do apartamento para a portaria. Os prestadores são cadastrados, mas só para serviços emergenciais, equipamentos que pararam de funcionar essas coisas, e todos de luva e máscara”, disse a síndica do Paseo. Lá dispensers de álcool em gel e capa para os botões foram colocados nos 19 elevadores. A entrada de quem não é morador é controlada. “As visitas são pontuais, não posso proibir, mas limitamos em quatro pessoas, no máximo, e as cuidadoras de idosos ou crianças a gente não pode proibir. Também aferimos a temperatura de todos os funcionários”, conta
Tânia Regina da Silva é síndica de um conjunto de seis edifícios em Mauá, com 192 famílias. O conjunto já teve cinco casos da covid-19, que cumprem isolamento. O playground também foi isolado. Colocaram comunicado na portaria, a entrada não é proibida, mas visitantes são dois, no máximo. Tem dispenser de álcool em gel e na entrada do prédio e pano de chão com água sanitária para limpar os sapatos. “Aqui tivemos 5 casos de covid no começo, dispensamos as duas faxineiras e colocamos pessoas mais novas, o zelador ficou em casa também. Tomamos todos os cuidados com as pessoas de risco”, relata.
Nos condomínios menores as medidas são iguais. No Verona, bairro Assunção, em São Bernardo, o síndico Duarte Júnior reforçou a portaria depois que o porteiro, do grupo de risco, foi afastado. “Agora eu tenho que dar assistência na portaria, é um condomínio pequeno, então a limpeza continuou normalmente. Deixamos aqui recomendações, que deram certo, como evitar aglomerações, reuniões familiares, com gente de fora, somente serviços emergenciais, a limpeza está de uma forma mais sistemática, os corrimãos são limpos com maior frequência”, relatou o administrador do prédio, com 46 famílias.
É diária missão de convencer moradores sobre restrição Situações em que moradores que não entendem as novas normas fazem os síndicos se desdobrarem durante a pandemia. (Foto: Banco de Dados)
O fechamento de áreas comuns, como piscinas, saunas, playgrounds, academias e churrasqueiras, não encontra apoio total dos moradores, que não acreditam na alta capacidade de transmissão co coronavírus ou que as medidas de restrição são exagero. O barulho é outra fonte de problemas.
Priscila Camargo Rosante de Andrade, que administra o Paseo Diadema, onde vivem 2,5 mil pessoas, diz que o trabalho de convencimento é diário. Tem casos de moradores que não usam máscara, então conversa, manda-mails. É advogada, então passa informativos quase que diariamente. Quanto ao barulho, antes da pandemia conversava e até fazia reunião entre as unidades, agora telefona e informa que tem de haver bom senso. “O relógio biológico de muita gente mudou para uns a hora de dormir é 8 da noite, para outros é 2h da manhã”, destaca. Para Priscila, a falta de sintonia sobre o que os governos dizem gera confusão. “O presidente diz uma coisa, o governador outra e o prefeito outra, eu não sou síndica profissional, mas meu é um papel muito importante, fazemos mediação e fazemos um trabalho que deveria ser do governo, de informar e orientar”, desabafa.
O barulho também é uma das preocupações de Tânia Regina da Silva, síndica em Mauá, com 192 famílias. O maior problema é a paciência, as crianças ficam em casa, os pais não sabem o que fazer, elas querem sair, fazem barulho e tem gente no sistema home office. O síndico Duarte Júnior, de São Bernardo, enfrenta a mesma situação. “Aqui a dificuldade está sendo o barulho com as pessoas em casa. “Não tive problema com festas, mas o horário biológico está desregulado e, por isso, às vezes, tem um que quer fazer algo com barulho mais tarde, mas as regras seguem normais”, reforça. (Colaborou Fernando Scerveninas)