O crescimento do desemprego, o achatamento da renda e o fechamento de lojas neste período de pandemia já começam a elevar a inadimplência em condomínios de Belo Horizonte – principalmente nos comerciais, que em alguns casos até dobrou, saltando para 12%
Foto: Lucas Prates.
Guilherme César afirma que a inadimplência atingiu mais os condomínios onde moram pessoas das classes “C” e “D”
Nos residenciais, especialmente onde moram pessoas das classes “C” e “D”, a falta de pagamento já atinge também, em média, 15%. Algumas empresas, inclusive, já reforçaram as equipes para intensificar as cobranças.
O advogado Guilherme César Albino Gonçalves, síndico profissional da GR Condomínios, conta que a expressão que tem mais ouvido neste período de pandemia tem sido “bom senso”. Segundo ele, muitas pessoas têm procurado a empresa para tentar parcelar ou até mesmo postergar a cobrança da taxa de condomínio. “A perda de renda foi determinante para o aumento da inadimplência, que chegou em média a 15% em maio deste ano em relação a igual mês de 2019”, conta.
Guilherme César, que administra 55 condomínios na capital, lembra que a inadimplência foi mais percebida nos condomínios onde moram famílias das classes “C” e “D”. “Pela experiência que temos, ocorreu mais onde existem moradores que são autônomos, trabalham em lojas, em lanchonetes”, conta, acrescentando que nos prédios de pessoas com renda mais estável, o aumento foi menor.
O síndico profissional Rodrigo Bragança Nascimento, que administra 22 condomínios, conta que a inadimplência nesse segmento saltou de 6% antes do período da pandemia para 12% agora. “Pessoas que tradicionalmente nunca atrasaram, boa parte ficou com dificuldade financeira”, conta. Ele lembra que os condôminos devem procurar a administração, o mais rápido possível, para renegociar o débito e não mostrar “negligência”.
Algumas empresas, como a GW, ampliaram a área de cobrança para minimizar o impacto da inadimplência. Gilberto Vespúcio, que administra 400 condomínios na capital, conta que tem conseguido garantir os pagamentos com a intensificação da cobrança. A empresa, que tinha um funcionário para esse fim, contratou mais dois.
“Como as pessoas estão muito apertadas financeiramente, elas deixam de pagar os juros do condomínio, que são menores, para pagar os mais elevados, como os do cartão de crédito. E nós percebemos que, quem normalmente paga em dia, mas que atrasou, quando cobramos, efetua o pagamento”, explica. Segundo ele, a inadimplência, que era em média de 8%, está estável em 10% devido às cobranças feitas por e-mail, telefone e WhatsApp.
O vice-presidente das administradoras de condomínios do Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (Secovi), Leonardo Motta, avalia que a alta de dois pontos percentuais na inadim-plência dos condomínios residenciais apurada pela entidade – saltou de 10% para 12% - é facilmente absorvida com redução e despesas nos prédios, principalmente com área de lazer, que foram fechadas neste momento de pandemia. “Os mais impactados pela pandemia foram os condomínios comerciais, escritórios e street shoppings. O pessoal não está faturando e as despesas continuam”.
Dívida pode levar proprietário à perda do imóvel em leilão
O presidente do Sindicato dos Condomínios Comerciais, Residenciais e Mistos de Minas Gerais (Sindicon/MG), Carlos Eduardo Alves de Queiroz, alerta que a “bola de neve” formada pela inadimplência pode levar o proprietário à perda do imóvel, mesmo que ele esteja financiado.
“Independente de ser o único bem, ele pode perder. No primeiro leilão, o imóvel vai pelo valor de avaliação. No segundo, por 50% do valor da avaliação. O condomínio pega a parte dele e o resto é devolvido ao ex-proprietário”, conta, lembrando que hoje já é possível entrar direto com a ação de execução.
Foto: Reprodução/Redes Sociais
Carlos Eduardo, presidente do Sindicon, disse que a taxa média de inadimplência passou de 7% para 10%
Carlos Eduardo aconselha que as pessoas inadimplentes busquem, o quanto antes, um parcelamento dos débitos. “A taxa de condomínio é o rateio de despesas comuns. Se uma pessoa tem uma unidade alugada, é preferível entregá-la, porque a dívida não para. O síndico não pode dar desconto, a não ser que uma assembleia aprove, mas acaba abrindo um precedente”, esclarece. Ele conta que a taxa média de inadimplência passou de 7% antes da pandemia para 10 % agora, mas avalia que a tendência é de alta.
O presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/MG, Kênio de Souza Pereira, conta que a mudança ocorrida no Código Civil de 2002 reduziu a multa moratória para 2%, o que desestimulou a pontualidade. “A limitação da multa em apenas 2% configurou um retrocesso e em nada beneficiou os condomínios”, avalia. Segundo ele, a norma anterior (Lei 4.591/64) dava liberdade aos condomínios de estipular multa de até 20% sobre o valor da dívida, o que desestimulava a impontualidade.
Kênio Pereira lembra que diante do alto custo do processo judicial, muitas vezes não compensa para os condomínios discutir pequenos valores, o que leva muitos condomínios à omissão de não agir com rigor, estimulando a inadimplência.
De acordo com o especialista, por outro lado, o Código Civil possibilitou a estipulação dos juros de mora em taxa superior a 1% ao mês, bem como permite que a convenção determine que o condomínio inadimplente arque com os custos do advogado contratado para postular a ação de cobrança.
“A adoção dessas cláusulas tem o efeito prático de moralizar a conduta dos condomínios tendentes a descumprir com suas obrigações, pois acabarão pagando juros que podem ser fixados, por exemplo, a 5% ao mês, já tendo decisões judiciais que confirmaram a legalidade de juros de até 10% ao mês”, disse.