Lançado em 2006, o projeto da Quadra 500 envolve a construção de 22 prédios residenciais de seis andares e de dois edifícios comerciais
A construção da Quadra 500 do Sudoeste foi tema de audiência pública na Câmara Legislativa na manhã desta quarta-feira (8). A discussão – que atraiu líderes comunitários, ambientalistas, urbanistas e representantes do governo do Distrito Federal e do Ministério Público do DF – dividiu opiniões. O debate foi marcado por questionamentos sobre os impactos ambientais da expansão do bairro, a situação jurídica do empreendimento, a observância do plano urbanístico de Brasília, além das condições de infraestrutura necessárias.
A polêmica envolvendo a construção da nova quadra se estende há mais de 10 anos. Lançado em 2006, o projeto da Quadra 500 envolve a construção de 22 prédios residenciais de seis andares e de dois edifícios comerciais. O complexo está previsto para ser implantado na região ao lado do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e do Parque das Sucupiras, uma das poucas áreas urbanas com vegetação nativa do Cerrado.
Alvo de ações judiciais, a expansão predial do Sudoeste teve a licença revogada várias vezes. Em março último, contudo, o Instituto Brasília Ambiental (Ibram) restabeleceu a licença de instalação da Quadra 500. Com isso, a atual proprietária do terreno – a Oeste Sul Empreendimentos Imobiliários, da família Constantino – precisa apenas da Autorização de Supressão de Vegetação (ASV) para iniciar as obras. A ASV é o instrumento que disciplina os procedimentos de supressão de vegetação nativa, detalhando as espécies presentes no local e o volume a ser desmatado.
"Me preocupa a construção da quadra, ainda mais sem o devido debate com a sociedade civil, que não foi ouvida", disse o deputado Reginaldo Sardinha (Avante), à frente do debate desta manhã. O parlamentar é autor do projeto de decreto legislativo nº 22/2019, que susta o parcelamento da Quadra 500 e anula a licença do Ibram.
Questionamentos e críticas – Diversos participantes da audiência se manifestaram contra a implantação da nova quadra do Sudoeste e levaram ao plenário da Casa faixas contra o empreendimento. "Não queremos que Brasília se transforme em uma selva de pedras" e "Mais aslfalto, mais carros, mais seca, mais calor?" foram algumas das frases estampadas.
O presidente da Associação do Parque Ecológico das Sucupiras, Fernando de Castro Lopes, questionou a autorização dada pelo Ibram: "A licença ambiental concedida ao empreendimento valia por cinco anos. Já se passaram dez anos desde então. Como o GDF autoriza sem novos estudos de impacto ambiental?". Pergunta semelhante foi feita em relação aos estudos de impacto no trânsito, considerando o aumento do volume de carros em circulação. Segundo Fernando Lopes, levantamento do próprio governo estima que a quadra vai abrigar 4.080 moradores e que serão mais três mil carros.
Assim como Fernando, outros participantes da audiência consideram, ainda, que a Quadra 500 adultera o plano urbanístico da capital federal. Essa é a opinião da arquiteta e urbanista Romina Capparelli, do Comitê Brasileiro do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos Brasil), que sinaliza que a área prevista faz parte da "escala bucólica" de Brasília; ou seja, se trata de área não-edificante.
Além disso, considerando o adensamento populacional e o aumento da área impermeabilizada, participantes alertaram para a possibilidade de sobrecarga dos serviços de água e esgoto e para a necessidade de infraestrutura adequada para a drenagem de águas pluviais.
Representando o Ibram, o chefe da procuradoria jurídica do órgão, Thulio Cunha Morais, assegurou que todo o projeto da empreitada foi avaliado com "cautela", levando em conta os aspectos jurídicos e ambientais. Ele garantiu, também, que a licença do Ibram observou manifestações de órgãos como a Novacap, o Detran e a Caesb.
"A Novacap que diz que esse projeto está Ok é a mesma que nos faz viver, há anos, as consequências das chuvas na Asa Norte", ponderou Jane Villas Bôas, ex-presidente do Instituto Brasília Ambiental. Em 2016, quando estava à frente do órgão, ela assinou a suspensão do empreendimento, por não considerar claras todas as garantias necessárias para a liberação.
Também presente no debate desta manhã, o deputado Leandro Grass (Rede) lamentou a especulação imobiliária no DF, "sem qualquer compromisso com o desenvolvimento sustentável".
Legalidade – Para a promotora Marilda Fontenele, da Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb) do MPDFT, o projeto urbanístico da Quadra 500 é problemático desde a origem. Conforme apontou, a previsão legal do empreendimento foi feita por meio de um decreto do então governador Rogério Rosso. Ela argumenta, entretanto, que a matéria deveria ter sido apresentada na forma de uma lei complementar, a qual precisaria da chancela da Câmara Legislativa.
Já o secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação do DF, Mateus Leandro de Oliveira, avalia que a construção da nova quadra – localizada em área particular – não apresenta qualquer obstáculo judicial ou legal. Ele garantiu que a pasta tem se pautado por uma atuação "estritamente técnica": "Não se trata de uma opinião pessoal, de ser a favor ou contra, mas as obras, a partir do licenciamento ambiental, podem ser iniciadas". E completou: "Feito todo o rito e cumpridos os requisitos, tecnicamente a Seduh não tem como se recusar a aprovar a construção".
"Não é uma causa perdida. É uma batalha política a partir de agora", defendeu a arquiteta Romina Capparelli. Outros participantes concordaram. "A CLDF tem de tomar as rédeas: a questão passa, sim, pelo Legislativo", disse a promotora Marilda Fontenele.
Histórico – O assunto foi tema de audiência pública da Câmara Legislativa há oito anos, em 2011. Na ocasião, foram apresentadas críticas bastante semelhantes às feitas nesta manhã. Leia aqui.